13.12.09

Ontem presenciei uma cena muito bonita, daquelas que quando você tá encostado na parede fumando um último cigarro a única caoisa que você pensa é que está no lugar exato, extamente onde você deveria e gostaria de estar. Os meus amigos cantando Luiz Melodia e Cazuza, rindo das piadas que a gente mesmo inventa, comemorando o alívio das boas notícias, eu me sinto realmente feliz de conhecer essas pessoas e poder ficar ali recostada na parede cultivando uma tímida adimiração por essas pessoas. Ontem o Sergio apareceu. Gosto pra caralho do Sergio, e das histórias inacreditáveis que ele me conta, e das broncas que a gente fica trocando e dos cigarros que sempre acabam antes de irmos embora.
Alguém que deveria estar ali, naquele exato momento quando eu me lembrei do dia que dançamos na cozinha da casa da Luana, porque alguma coisa ali me lembrava os dias mais divertidos dos últimos anos, e me lembrei de tanta coisa boa que tive vontade de dar pausa nas minhas memórias, porque não tava conseguindo respirar direito. Deu uma puta saudade.
Cafézinho do Jarbas com a mulherada na cozinha da Silvia , planejamos chá de bebê, casamento, uma viagem pra praia, um almoço e tudo isso e o churrasco e crianças correndo e perdendo chinelos e comendo melancia. Reunião de meninas no quarto, com direito a segredinhos e incenso e histórias de salvamento.
Estamos todos indo bem de alguma maneira, né?
Fora a vontade de chegar em casa e abrir a porta da varanda e acender um cigarro com ele, comentar das luzes na consolação, de enfetes de natal, do fato de os erros nunca mais irem embora, da vontade de tomar a coca-cola mais gelada do mundo e depois deitar na parte mais confortável do colchão com um travesseiro com o seu cheiro, e dormir ali e acordar daquele jeito, sabe...

Hoje é a última viagem com a mudança, quero abrir espaços para acertos, juntar alguns cacos...

Se alguém souber o nome da música que não sai da minha cabeça, não me diga, quero continuar imaginando coisas e lugares e personagens do meu jeito.

Bom domingo pra todo mundo!

11.11.09

ponto.

Aprendi muito cedo que algumas pessoas nunca vão conseguir enxergar através do meu olhar. Depois percebi que isso muitas vezes é dificil até pra mim. Encontrei pessoa legais que depois tiraram a capa de chuva e no fundo nem era tão legais assim. Quis ser aquela que as pessoas percebem, que perguntam, e derrepente essa percepção se misturou as perguntas e essa nuvem cinza de enroscou em mim. Contei grandes histórias pra quem me ouvia sem cobrar finais felizes, pra quem ouvia porque gostava e apenas porque gostava de mim, aliás, e essas histórias viraram fantasmagóricas e tristes lembranças, navalhando sorrisos e lapidando respeito, me perdi num conto onde a bruxa sai a 200km por hora numa harley e atropela o príncipe, os súditos e toda sua personalidade, ela vira uma personagem escrota e morre de overdose num banheiro ecológico do acampamento de um festival de clássicos da mpb. Daí lembrei que gosto de escrever uns contos, que tenho livros de poesia no armário, que sei descascar uma laranja em espiral sem rasgar a casca, e respirei fundo. Vieram na cabeça muito momentos, gargalhadas que quase me tiraram todo o ar do pulmão, e eram tantas e tão melhores que noites que passaram e sequer arranharam a memória. E uma tira da Mafalda me fez passar o dia tranquilo, é melhor que anti-depressivo. Tive uma idéia, que virou um plano, agora vou dominar o mundo e ninguém vai acreditar quando eu contar. Porque também sei, e isso há muito, que dá pra misturar tudo aqui dentro sem enlouquecer. A pessoa que me deu o melhor presente do mundo (e aquele amor honesto) tem algumas mágoas no bolso, e no armário da cozinha, e entre os dedos dos pés. E eu tenho uma bolsa imensa cheia de retalhos de meses que passaram por mim rápido demais, e remorso não passa com neosaldina, nem com abraço passa caralho. E me telefonaram com uma notícia que não cabia dentro do aparelho telefônico, eu vou ter um sobrinho, vou ser tia. Uma coruja de olhos enormes que vai ficar babando sobre o berço, isso vai ser muito divertido. Meu irmão com os olhos cheios, com o coração acelerado e um indescritível e despudoradamente bonito sorriso na cara. Senti denovo aquele frio na barriga, aquela coisa boa de esperar por alguém que vai chegar pra te ver, ou não mas que você fica imaginando que podia ser assim. Senti saudade também, como não sentia desse jeito que dói. Senti raiva e raiva é tão pessoal que mais parece egoísmo pra algumas pessoas. Ouvi músicas lindas, show dos meus amigos. Tenho um amigo que é um super herói, com capa e tudo, e ele voa. Aprendi a falar mais baixo, a roer as unhas, a separar cada coisa e cada causo. Vi que algumas pessoas confundem convivência com conveniência, mas que não perceberem ou acham que assim fica mais fácil, ou acham mesmo é que ninguém percebe. Fui ao cinema, paguei meia entrada e perdi um truque, me diverti até doer a barriga. Desci a rua falando de planos e sonhos, fazendo gracinha, me vi há um ano quando eu ainda não tinha medo de encarar o espelho. Recuperei a vontade de mim mesma, a vontade de me enxergar nas tuas feições e acertar o meu passo com o teu na calçada.
Descobri que não é o externo que tem me feito mal, e isso foi a coisa mais triste do mundo quando eu passei em frente a uma loja de brinquedos e vi um par de patins na prateleira.

5.11.09

Porque eu tenho o tamanho de uma menina e as marcas de uma mulher. Porque meu cabelo tá quase sempre preso, e minha unhas roídas ou vermelhas, e meu olhar perdido na minha imaginação que nasceu antes, que inventou os meus passos e topou com alguns medos. Porque eu tenho metade da idade que eu queria ter nesse exato momento, e quando isso aqui dentro dói desse jeito eu mordo os lábios e grito por dentro, quando isso aqui dentro dói eu tento sufocar os ponteiros do relógio dentro dos meus bolsos. Porque as vezes eu acho que aprendi cedo demais essa coisa incrível que vem de fora, e as vezes tenho tanta falta de jeito e de equilíbrio. Porque o meu sorriso tem se apago muito rápido quando viro a esquina, porque as esquinas tem sido outras. Porque ter quebrado aquele vaso contra o muro de tantas lembranças me causa uma loucura incontrolável. Porque eu gosto tanto de discos velhos e roupas que ninguém mais usa e as pessoas que estavam lá riem de mim e isso é tão sensível e são poucos os que percebem, que entendem, que enxergam a própria cara numa sala de espelhos. Porque o caminho da sua casa fica bem no meio do caminho da minha, como a cicatriz que eu deixei quando saí daí, como tudo que ficou pelo meio do caminho da sua casa até a minha. Porque eu tenho feito coisa legais, tenho acertado mais, menos, tenho revisto os filmes que nem vão mais passar.

22.10.09

ela pegou o ônibus errado. ela pegou o ônibus errado e eu estava sentado na última poltrona, olhando pela janela embaçada algumas mentiras que caíam na pista ao lado. pagou com o dinheiro trocado, revirou o fundo da bolsa e riu envergonhada pro cobrador que se pudesse lamberia seus peitos, o que já fazia com os olhos. tirou a última moeda e se encolheu pra cruzar a catraca apressada. mirou todos os lugares vazios, encarou todas as pessoas que nem notavam que ela tinha uma verruga na ponta da orelha, perto do brinco de argola, bijouteria. sentou perto de mim, olhou o relógio no pulso e calculou um suspirou, meditou uns instantes com o olhar perdido em qualquer direção. algumas mulheres perdem o olhar e nunca mais encontram. senti o cheiro do seu cabelo, do seu pescoço, senti o cheiro da sua respiração ofegante, quase um grito de pavor, senti pena do vazio que habitou entre nós dois. ela me olhou e sorriu, mas logo já olhava outra vez pro relógio e pro corredor do ônibus. nesse exato momento me dei conta de que eu é quem estava no ônibus errado, mas eu sabia que era o ônibus certo no caminho dela. porque eu queria perguntar as horas e convidá-la pra comer cachorro quente antes de umas cervejas, e depois eu a levaria pra andar por aí comigo. ou não. porque haveríam as escolhas.

3.10.09

Despia-se em frente ao espelho religiosamente as sete, todos os dias. Tinha medo de perder algum detalhe novo dos seios à pubis. Tinha uma tatuagem nas costas, bem no meio, uma centopéia com uma bengala pra cada par das cem perninhas. Era uma tatuagem assustadoramente colorida, que deslizava até sua bunda redonda. Sua fantástica bunda redonda! Escondia feridas no couro cabeludo, escondia maconha na terceira gaveta do móvel mais indiscreto da casa como se sua mãe fosse chegar do trabalho a qualquer momento e aí, seria descoberta. Perdeu a mãe por conta de um resfriado, o médico estava doente e não pôde chegar a tempo quando a velha engasgou com uma azeitona que mergulhava na taça com a bebida. Guardava os dedos em caixas de fósforo, numeradas compulsivamente, porque invariavelmente acabava usando-os para apontar a direção errada ou pra afastar um pouco a cortina do quarto conferindo se aquele vizinho pervertido ainda espera por seus novos detalhes, religiosamente as sete.

28.9.09

fora de área

Já são quase vinte dias sem internet. E isso foi bom pra mim, de certo modo. O ano tá quase no fim, né? O melhor pior ano da minha vida, não precisa de explicações. Muita coisa aconteceu até aqui, não quero falar muito sobre elas agora. Estou com saudades de algumas pessoas que são realmente importantes, angústia fudida no meu peito. Mas fico tranquila porque fico sabendo que as coisas de algum jeito vão bem pra essas pessoas, e isso é maior e mais gostoso de pensar no que nas minhas angústias. Minha saúde agora tá entrando na linha, não que eu estivesse com algum problema mais sério com ela. Saudade de comprar melancia na feira de domingo, e um abacaxi (ou dois), mas não é só ir lá e comprar e voltar pra casa, porque tem tudo aquilo que acontecia antes e depois, e a tarde, lembra?
Esse fim de semana foi bem divertido. Ontem foi aniversário da Manu! Ontem o corinthians empatou com o são paulo e isso beneficiou o Palmeiras! Minha mãe me disse que está com saudades, e nem imagina o quanto eu também estou...
Há dias estou com uma música na cabeça, uma música que eu nem sei de quem é, nem sei se existe mesmo. Mas é uma música bem bonita, viu. Acho que é aquela música fora de ritmo que vamos cantar juntos daqui quinze ou vinte anos, você sabe disso, né?
Amanhã tem o último show da banda Saco de Ratos, lá no Café Aurora, e eu queria muito ir lá ver e ouvir aquele show que não me cansa (e todo mundo, inclusive você, sabe que não é só por isso, também...)
Talvez.
Segunda-feira, 28 de setembro, acho que vai chover antes das três da tarde.

21.9.09

Sabíamos. Desde o começo sabíamos que nunca mais seriamos os mesmos, nossas vidas funcionavam juntas, numa ordem desgovernada, as vezes confusa. Doía. Cada vez que ela arrumava suas coisas, cada vez que voltava trazendo de volta olhos inchados. Perdemos. Muito de nós dois, a individualidade tirou férias eternas, o meu corpo e o seu corpo transpiravam juntos, não dava pra não perceber mas era um contrato ilimitado esse nosso. Cansávamos. De todo o desprezo que insistíamos tentar confrontar, de toda a angústia que a ausência rara marcava, das minhas mãos frias em seus seios, dos teus seios frios cruzando a rua. Sonhamos. Com quintais, filhos, amantes, um assassino como naqueles filmes, um outro domingo, um outro amigo em comum contando segredos que nós dois inventávamos. Dormíamos. Dormíamos.

Pedi pra não abrir os olhos, era uma coisa ruim de se levar na memória, mas você não deu ouvidos, e foi caminhando naquela direção, e foi caminhando pra muito longe de onde eu pudesse cuidar de você. Por que fez isso? Minha linda, por que você fez isso?

Esquecemos. Você primeiro, de você mesma primeiro, e de todo o resto em tão pouco tempo (foi rápido demais, não foi?). Esqueci. De que não era só te abrir os olhos, não era só cercar os portões dos teus descaminhos, talvez eu deveria ter ido até lá e não sei o que faria, mas estaria mais perto daquela areia movediça e daquelas sombras esquisitas. Você se foi. Eu fui também. Nós tínhamos um plano, e esse contrato eterno de sermos um do outro (você é minha, ainda). Bebíamos. Muito mais do que aos outros incomodava, muito menos do que as nossas vidas suportavam. Amamos. Os dois, as unhas, carnes e seus cabelos finos presos nas minhas roupas, nas minhas costelas e seu Cheiro dentro de mim, inflando os pulmões, socos, beijos, sua bunda em tudo que faço, aquela cama/refúgio onde nossos personagens e algo muito, mesmo, bem próximo do que você me explicava sobre felicidade. Sua voz. Sua música, seus ruídos, suas unhas vermelhas roídas. Medo. De que você fosse mesmo a mulher mais linda do mundo (e eu absolutamente certo disso), de que você não voltasse, ou da minha própria partida. Raiva. Porque minhas atitudes sempre foram precedidas de nenhuma cautela, porque suas fantasias sempre foram as maiores vilãs do meu ciúme, medo da vontade insuportável de nunca sair de perto de qualquer lugar onde estivéssemos juntos. Razão. Por ter sido você aquela menina no ponto de ônibus, por ter sido eu o cara que te emprestou aquele livro. Lembranças... quando as coisas estão mais distantes, quando é a saudade aqui onde você TINHA que estar. Amor. Por cada vez que você tirou a roupa olhando dentro dos meus olhos, por cada segredo que me contou no meio da madrugada, por sua pele cobrindo minha vida, por minha vida abrindo espaço pra você, por você louca rindo e gritando no meio da rua a piada mais engraçada do mundo, que nós inventamos, por viagens que nunca fizemos, pela família que nunca conhecemos, por nosso livro mágico, por nossos cigarros queimando num cinzeiro no canto do bar, por nossa cerveja descendo gelada e nossas vozes cruzando a maior e mais inexplicável sensação que alguém pode sentir, por nossas ressacas, nossas brigas, nossas declarações despudoradas, nossas roupas molhadas de chuva, nossas gripes e nossa varanda.

Tempo. Que não me agrada, que não nos deixa escolhas apenas muitas e muitas melodias. Tristes melodias.

18.9.09

Escondia os dedos dentro de caixas de fósforo. Escondia-se de todos os outros dedos que a apontavam.


Não nos davam muitas opções, escolhíamos por puro prazer de vê-las arrancando os cabelos e mordendo as carnes dos dedos, quando não sobrava mais unhas.

26.8.09

FELIZ ANIVERSÁRIO, DUDA!

(foto sequestrada do facebook do Sergio)


Hoje a Duda faz aniversário. Hoje a Duda faz 2 anos! Hoje faz um ano que eu fui lá pra zona leste de metrô num sábado a noite pra comer bolo e ver os olhos do Sergio cheios de lágrima com aquele vídeo no telão. Lembro da carinha da Duda, resfriada, olhando pros pais, pros avós, pra todo mundo que tava ali em volta da mesa do bolo com uma carinha de choro e manha no colo da mãe, e o engraçado é que a família toda estava com a fisionomia parecida, cada um na sua manha, todos segurando aquele choro de alegria. Dia de festa, a primeira festa da vida dela, e agora ela já está fazendo 2 anos e tem cabelos dourados, lindos.

Saúde e sorte pequenina!
Feliz Aniversário!

21.8.09

Alguns amigos já escreveram hoje sobre a madrugada estranha de sexta-feira. Hoje não é dia 13, mas as bruxas já se anteciparam e estão por todos os lados deslizando em suas vassouras. Eu já cruzei com algumas delas, muitas delas, todas elas passaram por mim com o dedo médio esticado. Algumas moram em pensionatos, dentro das paredes e gritam a noite toda. Outras falam alto e as vezes conseguem tirar a gente do sério. Outras querem te agradar sufocantemente. Todas essas, bruxas. E quando resolvem voar todas juntas, a noite pode ficar blue pra caralho (né, Marina?). Copos estilhaçam por cima de nossas cabeças, mas o estrago maior vem com o tempo, aquele amigo que falou mais alto, que acusou o mundo e a si mesmo por tudo, aquele amigo que se expôs ao avesso, ao outro que deixou espaços demais entre um "pontapé" e aquele abraço. Algumas aparecem com coletes e pranchetas e multam a fumaça do nosso cigarro.
E a madrugada foi arrastando suas correntes e as bruxas rodopiavam insandecidas. Será que só sobre nossas cabeças?
E tudo foi ficando mais sereno, as pessoas começaram a falar, a dar risadas, os infames continuaram infames, os mais calados cantavam baixinho. A chegou e me cantou uma música nova que ela tá fazendo, muito bacana. Daí a gente fez mais umas duas músicas que eu não vou lembrar e ganhamos algum prêmio por estarmos ali naquela hora. Ou por nossas letras bêbadas geniais!
Eu saí de casa pensando no caminho que eu fazia a pé do meu trabalho até a avenida paulista quase todo santo dia, a quatro pernas, dois sorrisos e aquilo que tem me feito mais falta. E eu no meio da noite escura que passava por mim...
E quando o Mario escreveu isso aqui "E eu espero que tudo realmente fique bem pra todos nós. Porque na verdade todos nós merecemos. Sabem porque? Porque todos nós somos gente boa. Não devemos julgar ninguém. Vamos simplesmente deitar nossas cabeças em nossos travesseiros e acreditar que apesar de sermos todos imperfeitos pra caralho, nós só queremos o melhor pra todos. Acho que é um jeito bom de ver as coisas." Acho que não se referiu apenas a essa tal madrugada estranha de sexta-feira.
E deixo aqui as palavras do meu Amigo Pierre "Da minha parte, preciso desses amigos para não afundar de vez. Sinto que muita vezes não consigo mais me manter na superfície, nessas horas dá uma vontade louca de desistir. Depois passa, tudo passa.Um brinde a todos esses Amigos que são minhas bóias. Saúde e Vida Longa."

20.8.09

Era só uma calcinha, ela disse limpando a boca com um lenço borrando o batom na frente do espelho. E calcinha é tudo igual, todas tem o mesmo cheiro e o tamanho e a cor e tem algumas com estampas e outras não, ela ia falando sem notar meu desapontamento, aquele lenço me cortava o coração.
Acordamos antes das onze, como de costume em todos os finais de semana, acordamos e ela já foi se enfiando debaixo do cobertor. Segurei seus cabelos, não era uma cena bruta, pedi que fôssemos tomar um café com leite em algum bar próximo. Você não quer? ela me enfiava aquele olhar de súplica de mulher, nuazinha, estiquei o braço até a cortina e escureci um pouco suas costas. Descemos ainda transpirando a madrugada anterior, a muitas madrugadas. Pedi um café com leite, pão com manteiga, ela preferiu café com conhaque e pão de queijo, mas o que tínhamos no bolso só deu pra dois cafés puros, voltamos pra casa.
A casa é um quarto que servia de depósito numa loja de produtos elétricos. O dono é um velho religioso, aparenta mais que sessenta anos, o que eu deduzo pelas rugas pois nunca perguntei. Nada de drogas e prostituas, foi tudo que ele me disse depois de me cobrar o primeiro mês. Primeiro um portãozinho estreito que dá pra um corredor estreito, comprido, depois uma escada em caracol, e meu lar. Ela veio pra cá depois de nos estapearmos num bar que agora nem me lembro ao certo qual foi, acordei e ela estava aqui com aquela calcinha e aquele cheiro. Nos casamos em frente a igreja numa noite louca de cigarros, me lembro de algumas drogas e muita bebida paga por alguém que descobriu isso com atraso. Eu aceito, eu disse, sim, ela respondeu. Na primeira briga depois do nosso casamento ela me aparece sem aquela calcinha que eu gosto tanto de vê-la usando, a sua calcinha sumiu, minha favorita, e o que ela me diz é que é só uma calcinha, essa diaba.
Tive uma alemãzinha que gostava de me preparar o jantar todas as noites, ela vinha com sacolas de supermercado, e suas fantasias, ela cozinhava como uma mãe cheia de temperos e sorrisos lançados pra mim, na poltrona, sempre sujo e mal humorado. Trazia comida e aquela bunda cheia de meus dedos. E eu comecei a esperar que viesse, as vezes eu tomava um banho e lavava os pratos da noite que passou, mas uma hora ela parou de vir, e nunca telefonou. Algumas pessoas não voltam, outras se vão.
Tenho uma mulher que perde calcinhas. Do está falando? limpando a boca com o lenço, não é nada, é o que eu vou lhe dizer beijando-lhe o pescoço pela última vez.

17.8.09

não é a cor da porta do seu armário que me incomoda. nem as chaves que você sempre esquece. nem me incomoda quando você repete aos gritos tudo aquilo, sobre aquilo, numa daquelas nossas brigas. é irremediável, mas não definitivo. não são as suas mãos cheias de dedos, isso nunca vai me incomodar. não são as horas que demoram a correr no relógio, nem a falta de assunto nos programas de tv. não são as crianças correndo na rua, bicicletas, patins. não é o futebol nem a fórmula 1. nem meus pais e suas trovoadas, nem a minha família enquadadrada num único porta retrato. não me incomoda ficar em pé num ônibus lotado, no metrô abafado, e as pessoas com pressa, e as pessoas sempre com tanta pressa que não veêm a vida passar. não são os clichês que me incomdam, você sabe disso.
nem a fila da padaria, mas a fila do banco entre os dias cinco e oito sim, me incomoda. não é o cara que olha desconfiado no corredor do supermercado, nem o outro cara que chega primeiro na melhor vaga do estacionamento desse supermercado. a conta no bar não incomoda, pelo menos não a mim, nem o tédio do garçom numa quarta-feira quase morta, pelo menos não pra mim.
não me incomoda o copo cheio, não me incomoda a mesa cheia dos amigos de sempre. nem o tédio, o inverno, o trânsito. não é o fato de que tudo pode dar errado, não é que tudo tenha que dar certo o tempo todo. não são gatos derrubando telhas, cachorros latindo, donas de casa exaustas, tensas, apaixonadas. nem minha mãe telefonando pra perguntar "tá tudo bem?". não é o maço quase vazio, não é o troco que sempre vem errado.
não são as pessoas que insistem em subir e descer escadas pelo lado esquerdo atrapalhando quem vem, não é a ignorância de algumas pessoas que encaram tudo de punhos cerrados, sempre, não. nem cartões de crédito, nem contas de água vencidas empurradas por debaixo da porta. não é o tempo que a água demora pra passar pelo filtro quando a gente coa o café.
não é o barulho do meu estômago vazio as quatro da manhã quando chego cambaleando e sorrindo sem motivos. não é a casa diferente, as roupas sempre as mesmas, a comida saudável que eu nunca como, não é o recente desejo de ter uma máquina de lavar.
não é a solidão que me incomoda, é a ausência daquilo que caiu e quebrou. não é o vazio dos bolsos, o que incomoda tá do lado de dentro, o que incomoda eu não consigo dizer, nem escrever, o que incomoda é exatamente isso, a covardia, minha.

11.8.09

quanto vale?

aquilo que você achou que era o melhor de si e deixou na chuva? aquilo que nenhum amigo seu jamais duvidou? aquilo atrás da cortina vermelha? aquilo que seus pais diziam que ia dar merda, quanto vale?

aquilo que você guardou entre os livros na estante? aquela última música... aquilo que a gente deixa entre uma despedida e outra?

4.8.09

Tem um espantalho de calças cor de anil, lá no jardim.

13.7.09

Meu nariz, o Flavinho... e eu!

a foto é do Luiz Felipe

7.7.09

Será que quando colocar o telefone no gancho isso vai passar?
Ela sempre me pareceu bem depois de nos despedirmos, ela sempre pareceu estar melhor que eu, na verdade.
Gosto daquelas sombras nas esquinas, do calafrio, da garrafa ainda cheia, do barulho do portão de ferro batendo nas minhas costas. Mas hoje não consigo sair de casa.
Gosto da noite assim como já gostei mais dela, e de cada pedaço daquelas carnes quentes que ela balança por aí dentro daqueles vestidos infernalmente excitantes. Ela é uma vadia e eu sempre soube, e gostei disso.
Agora ela tem uma casa, um cara bacana que conserta suas torneiras e eu arrisco apostar que ela finalmente comprou a tal torradeira.
Quando ela chegou em casa com aquele recorte do jornal mostrando aquele aparelho estúpido, e muito caro, e começou a falar e falar (gritos estrangulados e assustadoramente felizes) e queria me convencer com idéias de casamento, feira no domingo e essas coisas que ninguém vê em conto de fada, eu amassei o recorte e tirei o pau pra fora, os olhos dela umedeceram no exato momento que eu coloquei a mão no rosto dela, minha amantezinha loura, mas ela nunca foi mulher de ficar sofrendo. No outro dia ela levou todas as coisas dela, deixou apenas o que eu paguei, um lençol velho e uma xícara, trincada.
Mas será que se eu telefonar agora tudo aquilo vai emergir? As brigas, as porradas, o leite quente causando ânsia em minhas ressacas, será que tudo aquilo voltaria junto depois do telefone no gancho?
Porque eu quero que ela fique lá, com toda aquela felicidade que ela comprou, com toda aquela vida que ela plantou em vasinhos pequenos. Nenhuma mulher ficou aqui dentro tanto tempo quanto a minha amantezinha loura, nem quero que alguma delas fique, é que hoje é dia quinze, é meu aniversário, e dessa vez eu não queria dormir sozinho.

1.7.09

Caralho, já é julho. O ano já está pela metade, quase no fim na medida em que penso nas 365 coisas que eu pretendia fazer, uma de cada vez, uma por dia. Hoje acordei, quer dizer, amanheci no bar e quase não consigo manter meus olhos abertos no trampo. Dois pensamentos insistentes: aquele abacaxi docinho na geladeira, e o Ademir debaixo do cobertor comigo. Sabe aquela tal felicidade?


Trabalho numa oficina cultural em Taipas, caindo na Vila Brasilândia, as crianças daqui não tem play station 3, não vão ao cinema mais que duas vezes por ano (e tô sendo otimista!) nem sabem que Música, jonas brothers e funk são coisas totalmente diferentes. Essas crianças vem aqui todos os dias, algumas pela manhã, outras a tarde, elas brigam, xingam, correm e brincam, mas são menos crianças do que deveriam, mas quando eu chego aqui e os vejo reunidos discutindo a edição de um vídeo na aula de animação, ah cara, isso me deixa confiante nesse grãozinho de areia que eu tô ajudando a enfiar na vida delas. Agora ha pouco eles estavam cantando uma música do Mawaca, não conhecia, mas eles me fizeram gostar (confesso que na trigésima quinta repetição da mesma faixa eu fiquei mau humorada


Hoje é o primeiro dia do mês certo, quem está errada sou eu, na contra mão, mão furada.

23.6.09

Ticas

Vignon's Home

(falta a Carola, a Kátia e a Renata que tá tirando a foto)

16.6.09

HOJE tem rock'n roll em São Paulo



foto de Luis Felipe 'Ogro'



Saco de Ratos no The Wall Café
Rua 13 de maio, 152 - Bixiga
Hoje, terça, 22:30 hs


R$ 5 pra entrar
e chopp custa $2

8.6.09

o amor é a única coisa, eternamente nova
o tempo passa, e ele continua
botando a gente a prova

Meu Bem,
quando eu disser que te amo...
diga Me ama também.



Renato Fernandes
Receio que perdi o melhor que eu tinha daquilo que tínhamos.

28.5.09

Acordei cedo hoje, acordei e me estiquei no colchão que precisa de um tempo. Acordei.
Chovia, uma garoa fina me deu bom dia e riu-se de mim, eu de camiseta regata e calcinha em frente a porta de vidro pensando em coisas tão distantes que aquela garoa ria da minha cara descaradamente, e ela ria tão alto que dei as costas irritada. Pensei num banho quente, aquele longo banho quente, mas logo saí do box apressada com o horário e com a sensação de estar sempre tão atrasada. Mas eu tenho um emprego, e eu tenho um salário e isso as vezes não me parece o suficiente. Mas eu tinha um cheiro em volta de mim, um cheiro nas paredes e na fechadura e nas minhas coisas, em todas as minhas coisas, e eu sorri olhando novamente pra dança tola daquela garoa fina que descia pela avenida Ipiranga começando um dia, e eu comecei denovo, do começo. Deitei, levantei e me vesti, daí peguei um livro na estante, li um poema que me fez lembrar do aniversário da Duda e eu tentei começar o dia com aquele sorriso colado aqui, em mim, mas as coisas mudam tanto e tão depressa, e o tempo todo.

22.5.09

Pra começar a (próxima) semana:



Ademir Muniz dá a letra:


Na segunda-feira, 25, às 22h, Márcio Américo apresenta seu show de stand up no Centro Cultural Rio Verde.
Ele e os atores Aramyz e Márcio Reiff subirão ao palco com a Comédia On The Rock - Stand Up pra Rir e Pensar.Apareçam.


E deixem as crianças em casa.

(mais aqui)






E não me digam que há maneira melhor de se começar a semana.
Quem ainda não viu precisa desmarcar com urgência qualquer jantar em família, quem já viu sabe do que tô falando. Imperdível!

30.4.09

Jorge Luís Borges

Uma Oração
Minha boca pronunciou e pronunciará, milhares de vezes e nos dois idiomas que me são íntimos, o pai-nosso, mas só em parte o entendo. Hoje de manhã, dia primeiro de julho de 1969, quero tentar uma oração que seja pessoal, não herdada. Sei que se trata de uma tarefa que exige uma sinceridade mais que humana. É evidente, em primeiro lugar, que me está vedado pedir. Pedir que não anoiteçam meus olhos seria loucura; sei de milhares de pessoas que vêem e que não são particularmente felizes, justas ou sábias. O processo do tempo é uma trama de efeitos e causas, de sorte que pedir qualquer mercê, por ínfima que seja, é pedir que se rompa um elo dessa trama de ferro, é pedir que já se tenha rompido. Ninguém merece tal milagre. Não posso suplicar que meus erros me sejam perdoados; o perdão é um ato alheio e só eu posso salvar-me. O perdão purifica o ofendido, não o ofensor, a quem quase não afeta. A liberdade de meu arbítrio é talvez ilusória, mas posso dar ou sonhar que dou. Posso dar a coragem, que não tenho; posso dar a esperança, que não está em mim; posso ensinar a vontade de aprender o que pouco sei ou entrevejo. Quero ser lembrado menos como poeta que como amigo; que alguém repita uma cadência de Dunbar ou de Frost ou do homem que viu à meia-noite a árvore que sangra, a Cruz, e pense que pela primeira vez a ouviu de meus lábios. O restante não me importa; espero que o esquecimento não demore. Desconhecemos os desígnios do universo, mas sabemos que raciocinar com lucidez e agir com justiça é ajudar esses desígnios, que não nos serão revelados.
Quero morrer completamente; quero morrer com este companheiro, meu corpo.

29.4.09

Algumas coisas viram moda, é o que dizem(?). Músicas, filmes, livros, até paixão tá virando tendência. Bicho, é um tal de ser eclético.
Eu acredito que algumas coisas viram "aquelas coisas dos outros". Eu gosto e também deixo de gostar de um monte de coisas, mas é por minha conta e risco e tem um monte de gente que deve me achar bem estranha.
Sempre me incomodou a palavra "estranha", não sei explicar como foi que isso começou, eu mesma uso muito dela, uma vez por dia pelo menos. O que me incomoda é me referir a alguém assim, o que faço às vezes também. Não gosto quando me chamam de estranha, mesmo se for na brincadeira, eu disfarço, mas isso me incomoda e eu não sei mesmo explicar porque. Mas não é de mim nem de como me sinto com certos apontamentos agora.
Eu vi uma garota e um livro do Jack London, ela sentada ao meu lado no vagão do metrô, eu tava com sono e pensava num café quente mas quando eu reparei o título na capa do livro eu não consegui mais desviar minha atenção daquela moça. Não me lembro da aparência dela, lembro das unhas com esmalte quase vinho, ela tinha um anel no polegar e lia "O lobo do mar". Não, ela folheava o livro, assim como quem vira páginas de um livro com receitas de bolos, escolhendo o tipo mais saboroso, o recheio mais saboroso, a cobertura mais saborosa. Página por página virando a esmo sem pausa.
Ela podia estar procurando alguma anotação, talvez quisesse reler aquele capítulo que mais gostou. Talvez só estivesse admirando as páginas, por que não?
Página por página virando acompanhadas por meus olhos agora já despertos, e um tanto angustiados, como são pela manhã.
Quando eu li esse livro me deparei com uma leitura fantástica, conheci ali um escritor que é hoje um dos meus preferidos, o conflito naquela embarcação - a Ghost - me tomaram de uma emoção e excitação difícil de explanar. Outra noite um amigo me disse que estava lendo um outro livro do London, não lembro agora qual era, e quase com a mesma emoção que eu acompanha as mãos daquela moça virando as páginas eu falava pra ele sobre minhas impressões com esse livro.
Ela percebeu que eu a olhava curiosamente e desprendeu um sorriso, e eu lhe disse "eu adoro esse livro!" no que ela fuzilou "um amigo esqueceu na minha casa, mas eu não li não, não gosto desses livros antigos, são muito parados pra mim, tô lendo aquele livro da Sônia Abrão, sabe qual é?"
O metrô descarrilhou e todos os senhores passageiros foram soterrados abaixo da avenida São João, inclusive eu e a Sônia Abrão. Final feliz pro Lobo Larsen*.
Claro que eu disse "ah, eu sei" porque a conversa findava ali, sem nenhuma explicação sobre que tal livro essencial deva ser esse, o que a moça tá lendo.
O amigo dessa moça tem sorte, pois vai receber de volta seu livro cuidadosamente intocável. Essa moça que eu não sei o nome e nada mais que a cor do seu esmalte, não vai mesmo gostar daquele livro, porque não dá pra encarar essa briga sem se machucar, pelo menos um pouco. É uma pena trazer no bolso certas afirmações.
Eu sei, tô chutando cachorro morto aqui, mas é que me falta ar em alguns locais, e isso tem sido bem estranho. Tô trombando pessoas bem Estranhas, e não tem sido incômodo chamá-las assim.



*Lobo Larsen
é um personagem do livro O Lobo do Mar, do Jack London

17.4.09

interurbano

-Vai lá no Alves e diz que eu quero falar com a Regina, quero falar com ela agora.
Mas toma cuidado com ele, corno é traiçoeiro. Se ele concordar de primeira vai embora e deixa quieto, ele pode estar tramando alguma coisa pra gente, é, você tá metida nisso agora também.
Se ele ficar preocupado você aproveita o nervosismo e diz que eu tô com umas fotos aqui, ele vai perguntar que fotos e você diz que não interessa e manda ele chamar logo a Regina.
Eu sei que não vai ser fácil, mas eu não posso fazer tudo por você, vai lá e faz sua parte que é a mais fácil. Se alguém tá correndo risco aqui sou eu. Deixei uma mala na porta da sua casa, é pra botar as coisas dela, isso, tudo, não vamos mais voltar naquele lugar.
O Alves é gente boa mas uma coisa não tem nada a ver com a outra, a Regina nunca gostou de todo aquele luxo. Uma vez eu disse que ela teria vida de princesa comigo, foi quando ela foi embora. Não me faça perguntas, você tá querendo me fuzilar, é? Olha aqui, você me deve esse favor, você me deve muito e eu não sou de cobrar, você sabe, mas agora vai lá e acabamos de uma vez com isso.
Medo? Medo daquele corno? Eu acho é que você tá querendo pular fora, isso, abandonar nossos planos. Nosso sim senhora, agora vai que a gente tá perdendo muito tempo. Espera, repassa tudo que eu te falei... certo. Diz também que eu sinto muito por ter que fazer isso, mas eu não negaria um pedido daquela mulher, sim, diga que foi ela quem pediu pra que eu a tirasse de lá, não importa, ela não precisa saber que você disse isso porra. E não esquece de levar alguma coisa pra deixar a boca dela bem fechada.

30.3.09

33!

pro Ademir Muniz,
com amor!


25.3.09

Quando meus pais decidiram me batizar (já cometendo mais um erro), escolheram por mim padrinhos, padres, convidados e essa coisa de religião. Meu pai nunca foi católico, descobri isso depois, minha mãe tinha mais tolerancia com igrejas, mas ela era kardecista, o meu pai já foi muitas coisas, minha mãe sempre respondia que era católica quando alguém perguntava, ela me disse que se dissesse que era espírita as pessoas fariam mil especulações e julgamentos, se dissesse kardecista ninguém saberia do que estava falando e fariam mais perguntas, e sendo católica era mais fácil ficar invisível em certas conversas. Mas eu falava do batismo, né? Eu não me lembro de nada, nem de quando tudo isso foi acertado, eles me carregaram até a bacia e molharam minha cabeça e disseram algumas coisas e pronto, agora eu não teria mais pesadelos. Foi o que disseram lá, né?
Meus avós paternos foram meus padrinhos, minha avó já faleceu e meu avô casou-se novamente e tem uma filha de cinco anos que ele já deve ter batizado também, meus pais são os mesmos de antes e acho que todos já esqueceram da farra da água na bacia, né?
Com 11 anos eu frequentava as missas de domingo, todo domingo sem faltar em nenhum, eu ia sozinha, logo de manhãzinha, eu gostava sim, e ainda me livrava da "faxina geral" que meu pai impunha a nós, filhos, logo depois do pesca & cia no canal 5.
Eu me inscrevi no catecismo, dois anos na salinha dos fundos da paróquia, aos sábados. Quando faltava 1 mês pra minha primeira comunhão o padre, Cícero, nos pediu os atestados de batismo, levei o meu dentro de uma envelope usado todo rabiscado com continhas e recados pra alguém retornar uma ligação, entreguei pra ele o 'meu batismo' e saí da sala (era uma salinha pequena com cheiro de parafina derretida). Ele mandou me chamar, entrei na sala resmungando pra mim mesma aquele fedor, ele esticou o meu batismo e disse com a maior naturalidade do mundo "isso não vale, não vai poder comungar, vai ter que refazer tudo" e eu não entendi o que aquilo significava e arrisquei infantilmente um "por que?" daí ele (não) me explicou que eu tinha sido batizada em uma igreja católica apostólica brasileira, e meu batismo não servia ali, igreja católica apostólica romana, teriam que me re-batizar. Peguei de volta meu documento da água na bacia e fiz questão de pedir meu envelope de volta. Dali mesmo eu fui pra casa, confesso que a princípio um tanto chateada com a notícia. Daí fiquei pensando no que ele disse e fiquei triste com o fato de ter que substituir minha madrinha, a minha avó, já falecida, e isso pra mim era inconcebível, escolher alguém pra substituí-la só porque eles me obrigavam a isso.
Abandonei a catequese duas semanas antes da "formatura", no meu último dia eu me confessei com o padre Cícero e na saida ele perguntou se eu tinha resolvido minha situação (ele falou assim mesmo, situação) e eu balancei a cabeça afirmativamente, e essa foi a primeira mentira depois da primeira (e única) confissão.
Foi quando comecei a questionar a igreja, foi quando comecei a enxergar aquela coisa com uma pitada antipatia.
Porra, eu tinha 11 anos e uma avó-madrinha morta, não tiveram nem a decência de me explicar isso de um jeito menos duro. E ainda tentaram uma lavagem cerebral discreta, terrorismo psicológico que não colou "porque aos olhos Dele isso não passa desapercebido, filha" e blábláblá...

Hoje eu li no blog da Luana algo que me fez lembrar disso, e pensar nessas merdas que estão aí decarrilhando a igreja católica apostólica romana ladeira a baixo.
Creio (como católica apostólica brasileira, e Palmeirense!) que alguns deles estão ferrados, porque já me disseram que pra Ele nada passa desapercebido,né?

12.3.09

"Eu não sabia que o mundo era bem melhor que a minha casa, senão tinha ido antes" - Rubens K (aqui)
Quando eu nasci morei um dia numa casa lá no Jabaquara, foi um dia só e no outro eu já estava num bercinho na casa que cresci e enlouqueci. Lembro de como a casa era pequena e de como foi ficando bonita com as reformas que meu pai foi fazendo, subindo paredes, colocando janelas. Eu ganhei um quarto só meu e meus irmãos dividiam o quarto azul. Eu gostava tanto daquela casa, dos vidros coloridos da porta da sala, da escada que ia pro meu quarto com aquela janela alta que deixava a luz invadir tudo. Gostava de ter espaço e de ter portas pra fechar quando alguma coisa me fazia mal. Era só fechar a porta e pronto, eu conseguia ficar sozinha com meu rádio.
Mas chegou uma hora, e não consigo me lembrar quando aconteceu, que tudo aquilo pra mim foi tornando-se insuportável. Cada cômodo me incomodava. As paredes eram feias e emboloradas demais pra que eu tivesse ainda vontade de ficar encarando do sofá.
Meu quarto já não era só meu, minha cama começou a dividir espaço com outra cama, portas batendo com fúria, coisas se estraçalhando contra paredes. Nenhuma música me fará esquecer esses sons. Cada minuto fora daquela casa me fazia bem, ou não, mas cada minuto fora dali era o que eu mais queria.
Eu senti uma tristeza tão filha da puta quando percebi que eu não poderia mudar aquilo, que aquelas pessoas não mudariam e eu não conseguia mais me comunicar com elas. Foi quando comecei a enlouquecer, foi gradativa a coisa.
Depois uns trampos de merda, salários de merda, eu com 17 ou 18 anos e já essa ânsia em mudar tudo e me foder, ou me dar bem, eu só queria saber como deixar de fazer parte daqueles álbuns.
Daí eu conheci alguém que gostou de mim, e que me deixou gostar dele desse meu jeito. Alguém que sabia que eu tinha muitas mágoas aqui dentro e que eu não conseguia separá-las da minha vida, porque agora sei que elas não são parte da minha vida, não completamente. E fomos construindo alguma coisa que não sabíamos do que chamar, fomos entrando um dentro do outro, fomos caminhando trocando as pernas como naquela música do Chico. Eu fazia planos, eu queria dividir parte desses planos e nada acontecia. Comecei a colher minhas próprias cicatrizes, e mergulhar em minhas loucuras, embriagar os tais sonhos, e cada vez mais longe daquela casa e daquela vida estranha que nunca consegui chamar de minha.
Alguns anos correram, eu mandei um emprego à merda, mandei tomar no cú com tanta felicidade que quase chorei. Eu aprendi coisas na noite, eu tive coragem de assumir pra mim mesma algumas outras. Descobri que amor não acaba, que ele fica sempre aqui dentro, que ele acontece só uma vez, mesmo que só cause encrenca.
Hoje acordei e encarei paredes diferentes, senti saudade da minha mãe por motivos que eu não vou contar aqui, abri a geladeira e tudo é tão diferente agora. Escovei os dentes enfiando meu olhar no rejunte dos azuleijos do box, são de outra cor. Pensei em produtos de limpeza, em roupas sujas, em macarronada com azeitona e milho verde. É outra casa que talvez eu não tenha escolhido, não foi um plano, e eu tô me sentindo feliz ali, mesmo que as coisas ainda não estejam bem certas pra todas as pessoas. Porque algumas pessoas estão metidas, de algum jeito, nisso.
Hoje quando eu acordei eu estiquei meu braço e bati na cabeça dele, ele se revirou e resmungou alguma coisa, ele fala dormindo. Eu pensei nas minhas escolhas, e abri um sorriso, um sorriso bem idiota e meio torto, meu olho nem tava abrindo direito, ele abriu os olhos e disse que eu tava atrasada, eu fui correndo pro banheiro, foi quando fiquei encarando azuleijos.
Não sei se está tudo bem comigo, mas posso adimitir que as coisas estão bacanas pra mim. Tenho tido poucas horas de sono, sim, mas isso é escolha minha, e dessa vez não me sinto cansada. Vinte anos e trezentos e sessenta e quatro dias depois.

28.2.09

Eu queria que todas as palavras viessem pra essa tela com a mesma força que entram na minha cabeça, no coração. Elas me atropelam, encharcam minha vista e me trazem medos que talvez nem sejam meus. Nesse exato momento elas fugiram, assim como a noite que se escondeu de mim, nesse exato momento. Eu vejo do alto os carros passando, pessoas trocando suas casas pelas calçadas num sábado que começa sem garoa. Essas pessoas não podem me encarar de perto agora, elas nem imaginam que aqui falo sobre elas e sobre suas vidas. Isso é estranho, pois eu posso falar de algumas mulheres que estão saindo de suas camas preocupadas demais pra olhar pro lado, pra encarar quem dorme ali ao lado, ou pra abraçar e brigar com quem elas gostariam que ali estivesse. Posso descrever aquele homem que acabou de chegar cansado com pouco dinheiro, que passa pelo quarto dos filhos e sorri quando vê que um deles ainda não chegou. Posso falar do porteiro do prédio que troca de turno e veste a camiseta do seu time. Hoje tem jogo de futebol. Posso falar dessa casa com carpete e de como é insano olhar pra dentro dos apartamentos no prédio da frente, ver a sala pequena, o quarto mal iluminado, dois homens na janela do meio , duas moças e uma senhora na janela da direita, alguns brinquedos espalhados na varanda pequena mais abaixo.
Todas as minhas palavras se foram, agora mesmo eu as tinha aqui bem perto, mas elas disputavam o ar com meus pulmões e eu as expulsei, eu disse coisas horríveis que ninguém nunca vai saber. Por dez minutos eu poderia explicar o que é o amanhecer, quando a temperatura cai e as nuvens se espalham, daí a noite sai correndo sacodindo uma risada frouxa que eu não consigo esquecer.
Parte de cidade acorda e o sol vai começando a aparecer, primeiro se enfiando pela janela incomodando um pouco, e ele entra, entra dentro da gente e começa um dia novo, novinho, sem perguntar nada, sem se importar com o que você está querendo, pensando, bebendo, ele entra dentro de você fazendo uma festinha sacana, assim sorrateiro. E ninguém percebe.
Queria que ele me perguntasse algo antes de me invadir ou de me queimar minha pele. Mas eu não saberia o que responder porque nenhuma palavra me sobrou da noite tão próxima que acabou, e logo vem outra, e eu com novas palavras e essa dor filha da mãe que mesmo que eu mande embora, que eu chute, esporre, expulse, essa dor filha da mãe que fica. Ela enamora a noite, ela se enamora com o sol e com o barulho do transito, ela tá sempre aqui e eu só queria mesmo era saber como falar dela, sem beleza nenhuma, só queria saber explicar cada pedacinho dessa filha da mãe que entra fundo aqui dentro pra fazer festa, e faz mesmo.

13.2.09


AMOR


Amor, então,

também, acaba?

Não, que eu saiba.

O que eu sei

é que se transforma

numa matéria-prima

que a vida se encarrega

de transformar em raiva.

Ou em rima.


Paulo Leminski

Só As Mães São Felizes

"Você nunca varou
A Duvivier às 5
Nem levou um susto
Saindo do Val Improviso
Era quase meio-dia
No lado escuro da vida

Nunca viu Lou Reed
"Walking on the wild side"
Nem Melodia transvirado
Rezando pelo Estácio
Nunca viu Allen Ginsberg
Pagando michê na Alaska
Nem Rimbaud pelas tantas
Negociando escravas brancas

Você nunca ouviu falar em maldição
Nunca viu um milagre
Nunca chorou sozinha num banheiro sujo
Nem nunca quis ver a face de Deus

Já frequentei grandes festas
Nos endereços mais quentes
Tomei champanhe e cicuta
Com comentários inteligentes
Mais tristes que os de uma puta
No Barbarella às 15 pras 7

Reparou como os velhos
Vão perdendo a esperança
Com seus bichinhos de estimação e plantas?
Já viveram tudo
E sabem que a vida é bela

Reparou na inocência
Cruel das criancinhas
Com seus comentários desconcertantes?
Adivinham tudo
E sabem que a vida é bela

Você nunca sonhou
Ser currada por animais
Nem transou com cadáveres?
Nunca traiu teu melhor amigo
Nem quis comer a tua mãe?

Só as mães são felizes... "

9.2.09

Te Peguei Malandro

Ele voltou com o blog e não avisou ninguém. Farsante!



Mas ou denunciar pra todo mundo (porque sou uma Erva Daninha peçonhenta):




3.2.09

entrei no cinema e já fui direto pra bilheteria dizendo no nome do filme e pagando e retirando meu bilhete e já fui direto, agora, pra fila das pipocas, aquelas maiores, pedi a grande, coca-cola grande também, um café, paguei, retirei tudo e me encostei no canto olhando pra cara das pessoas. eles têm aqueles sachês de pimenta, é molho de pimenta, e eu enchi minha pipoca com aquilo, e os bolsos, porque nunca dá pra "melar" tudo de uma vez só. tomei meu café deixando a fumaça entrar pelo meu nariz e quase queimando minha língua eu saboreava um daqueles cafés expresso que não lembrariam nunca o café com leite da casa da minha avó Aparecida.

vinte horas, dezessete minutos e tic-tac-tic-tac-tic-tac...

termino meu café, saio de um canto e me encosto noutra parede, encaro outros rostos e dou de cara com o Pinduca, muito bem acompanhado com o Yan e a Naiara, seus filhos, eu vou pra fila da sessão das vinte e trinta e deixo um abraço com o Pinduca!

segunda fila, última poltrona no canto esquerdo, sabia que ninguém ficaria na minha frente, nem perto de mim, todo mundo senta do meio pra trás, fico livre dos risinhos, do barulhinho dos papéis de balas, de zíper descendo, de língua e baba e cof-cof, e aqueles suspiros intraduzíveis.

muito trailer depois...


trilha linda, eu fiquei emocionada, porque música espanhola me deixa assim.

tudo, achei o filme lindo!


saí do cinema cheia de impressões e comentários e com aquela música linda na minha cabeça e precisava tanto de um cigarro e de passos largos e tinha aquela garoa fina...

desci a Augusta sem guarda chuva, acendi um cigarro, mais outro e outro. esbarrei em uma menina amistosa que equilibrava um guarda chuva enorme, ela era muito bonita.

quase entrei num bar pra tomar uma cerveja, ficar jogando fumaça de cigarro pro alto, pensando longe, olhando pra rua... mas continuei andando, apertei mais o passo e fiz sinal na parada do ônibus.

veio devagar uma tristezinha chata, filha da puta mesmo, e ela sentou no banco ao lado e ficou me contando uma porção de histórias.


hoje "o dia amanheceu chovendo e a sauade me contém"



26.1.09

segunda-feira

Tem gente que enfia o pé na jaca de vez em quando, ou fica alternando, direito-esquerdo-direito-esquerdo. Todo mundo vacila ou "faz de propósito" uma hora.
Dá-lhe cerveja pra moçada! Aumenta o som que eu já tô vendo neguinho se estabacar no corredor!
Eu já me meti em apuros, já vomitei na roupa (de uma amiga querida, aliás), já senti vontade de tirar a roupa e sair correndo por aí. Já briguei, mas saí fora porque sou pacífica (trouxa e fracote) demais pra ir pra porrada. Pois é, sou uma mulher sincera.
Mas tem hora, e aí já é quase tarde demais, que a gente (pra não falar em primeira pessoa) enfia os dois pés na jaca mole e sai patinando por aí. Todo mundo vê, todo mundo mesmo. Aí você desliza na sua jaca mole por quilômetros e ninguém te segura, você pode tudo, você é invencível, você até sente que pode voar. E pode mesmo meu irmão. É só você ficar bem certo de que depois desse passeio, depois de lutar contra os monstros e salvar todas as mocinhas você vai ter que voltar pro seu esconderijo e encarar a verdadeira identidade que lhe cabe, num espelho que não é mágico. Esse é o lance, e você encara se achar que guenta o tranco depois. Porque as vezes meu caro, a consequência só é visível dentro da sua cabeça.
E isso já é o suficiente pra começar a semana.

23.1.09

5.1.09

"Se algo de bom nos acontece bebemos pra comemorar. Se algo ruim nos acontece bebemos pra tentar esquecer... Se nada nos acontece, bebemos para que algo aconteça" - Charles Bukowski