Quando eu tinha nove anos as coisas já estavam complicadas. Explico, minhas coleguinhas (é bacana falar assim né), todas da minha idade, todas "curtindo", todas umas safadinhas. No colégio o mais interessante era correr atrás dos meninos e tentar arrancar um beijinho de um deles. Verdade, eram todas umas loucas. Eu não participava muito disso. Verdade. Tinha um medo terrível dos meninos. O que me apavorava era pensar na minha boca colada na boca de algum deles, ou na mão de algum deles muito perto da minha numa situação que não fosse uma briga ou uma brincadeira na rua. Aquelas meninas nem sabiam somar dez mais um e já se enchiam de batom e escreviam cartas cheias de propostas. Aquilo era muito louco pra mim, eu não conseguia entender aquilo. Uma vez, admito, escrevi uma cartinha pra um garoto. Foi na terceira série. Caprichei na letra, passei perfume na folha (que ajudou a borrar toda a tinta da caneta), e no final eu dei um beijo com batom vermelho. É engraçado lembrar disso...
Mas fico pensando que o que acontecia era muito perigoso. E agora tenho certeza disso e me preocupa pensar em tudo isso. Os meninos na época queriam saber de sacanear um ao outro, de pular muro, de jogar futebol, de "brincar de mão", de tirar uma com as meninas. Mas nenhum queria saber de beijos e abraços e cartas melosas. Eram apenas moleques e se divertiam pra caralho assim. As meninas ficavam lá preocupadas com coisas que hoje ainda não me preocupam tanto. Aos noves anos eu tinha o joelho direito todo estourado e tava cheia de cicatrizes nas pernas e nos braços. Meus cabelos estavam sempre embaraçados e eu vivia pegando piolhos na escola. Era quase um moleque perto das outras meninas. Me diverti tanto, briguei na rua, tocava a campainha das casas e saía correndo. Via, e mesmo sem sacar plenamente o que tava acontecendo, a tristeza daquelas garotas que tinham preocupações demais para seus diários. Perdiam as mais sensacionais aventuras pra não estragarem suas sapatilhas. Deixavam de tomar banho de chuva pra não estragar os vestidos e os penteados com presilhas e acessórios coloridos.
Minha infância foi muito bacana, muito! Eu brincava com meus irmãos, dois meninos, quase o dia todo e na escola eu tinha mais uma porção de amigos, moleques, e as meninas sempre me botavam em frias e me chateavam. Queria que elas participassem das nossas brincadeiras. Queria que elas soubessem o quanto era divertido correr pelos quarteirões do bairro pra deixar o esconde-esconde mais complicado. Queria entender porque elas falavam de coisas que faltavam tanto tempo...
O que eu quero dizer é que acho perigoso o que acontece com essas meninas. Porque elas deixam de ser criança. Elas começam a sofrer mais cedo. Muito cedo. O sofrimento começa sutil, quase imperceptível. Dúvidas, medos, paixões e depois as dores. Pros moleques o tempo encaixa. E eles acabam ficando pra trás, o que só os favorece, o que os livra de traumas.
Hoje, eu conversei com uma garotinha e ela me disse que estava com um problemão. Eu quis saber qual era seu problemão. "é que o Marcos, o menino mais bonito da minha classe, me chamou de baleia, e todos os outros garotos começaram a rir de mim" isso eu já tinha sentido na pele, tentei fazê-la entender alguma coisa do que tinha acontecido "sabe, os meninos dizem coisas assim pra te irritar, se você der bola eles não param nunca, se entrar na gozação eles desistem de você e vão perseguir outra pessoa"... "eu falei pra minha mãe que a partir de agora eu só vou comer um pouquinho, e nada de doces, porque eu não quero ser uma baleia, nunca, eu quero namorar".
Me assusta esse tipo de conversa. Não tenho filhos, portanto não tenho ninguém dependendo exclusivamente de mim. Alívio. O que eu disse pra essa garotinha não passou nem pelo ouvido da pequena. E ela vai sofrer, desde já. E isso nunca vai parar, porque ela vai crescendo e tudo isso vai aumentando.
Tenho medo da infância porque ela não é bacana com todo mundo, às vezes ela sacaneia e deixa marcas que vão estragar tudo pela frente. Mas eu me lembrei da cartinha que eu escrevi pra um garoto na terceira série e achei tão engraçado. Queria saber o que estava escrito no meio daquele perfume charisma da minha avó. Mas eu não lembro dessa parte, só tenho algo antes dos primeiros vergões na canela.
Mas fico pensando que o que acontecia era muito perigoso. E agora tenho certeza disso e me preocupa pensar em tudo isso. Os meninos na época queriam saber de sacanear um ao outro, de pular muro, de jogar futebol, de "brincar de mão", de tirar uma com as meninas. Mas nenhum queria saber de beijos e abraços e cartas melosas. Eram apenas moleques e se divertiam pra caralho assim. As meninas ficavam lá preocupadas com coisas que hoje ainda não me preocupam tanto. Aos noves anos eu tinha o joelho direito todo estourado e tava cheia de cicatrizes nas pernas e nos braços. Meus cabelos estavam sempre embaraçados e eu vivia pegando piolhos na escola. Era quase um moleque perto das outras meninas. Me diverti tanto, briguei na rua, tocava a campainha das casas e saía correndo. Via, e mesmo sem sacar plenamente o que tava acontecendo, a tristeza daquelas garotas que tinham preocupações demais para seus diários. Perdiam as mais sensacionais aventuras pra não estragarem suas sapatilhas. Deixavam de tomar banho de chuva pra não estragar os vestidos e os penteados com presilhas e acessórios coloridos.
Minha infância foi muito bacana, muito! Eu brincava com meus irmãos, dois meninos, quase o dia todo e na escola eu tinha mais uma porção de amigos, moleques, e as meninas sempre me botavam em frias e me chateavam. Queria que elas participassem das nossas brincadeiras. Queria que elas soubessem o quanto era divertido correr pelos quarteirões do bairro pra deixar o esconde-esconde mais complicado. Queria entender porque elas falavam de coisas que faltavam tanto tempo...
O que eu quero dizer é que acho perigoso o que acontece com essas meninas. Porque elas deixam de ser criança. Elas começam a sofrer mais cedo. Muito cedo. O sofrimento começa sutil, quase imperceptível. Dúvidas, medos, paixões e depois as dores. Pros moleques o tempo encaixa. E eles acabam ficando pra trás, o que só os favorece, o que os livra de traumas.
Hoje, eu conversei com uma garotinha e ela me disse que estava com um problemão. Eu quis saber qual era seu problemão. "é que o Marcos, o menino mais bonito da minha classe, me chamou de baleia, e todos os outros garotos começaram a rir de mim" isso eu já tinha sentido na pele, tentei fazê-la entender alguma coisa do que tinha acontecido "sabe, os meninos dizem coisas assim pra te irritar, se você der bola eles não param nunca, se entrar na gozação eles desistem de você e vão perseguir outra pessoa"... "eu falei pra minha mãe que a partir de agora eu só vou comer um pouquinho, e nada de doces, porque eu não quero ser uma baleia, nunca, eu quero namorar".
Me assusta esse tipo de conversa. Não tenho filhos, portanto não tenho ninguém dependendo exclusivamente de mim. Alívio. O que eu disse pra essa garotinha não passou nem pelo ouvido da pequena. E ela vai sofrer, desde já. E isso nunca vai parar, porque ela vai crescendo e tudo isso vai aumentando.
Tenho medo da infância porque ela não é bacana com todo mundo, às vezes ela sacaneia e deixa marcas que vão estragar tudo pela frente. Mas eu me lembrei da cartinha que eu escrevi pra um garoto na terceira série e achei tão engraçado. Queria saber o que estava escrito no meio daquele perfume charisma da minha avó. Mas eu não lembro dessa parte, só tenho algo antes dos primeiros vergões na canela.