18.7.08

Já chamou sua mãe de mamãe? Pai de papai? Titia? Vovó? Eu chamo minha mãe de senhora, a dona da casa, a mulher que chora escondida pra não magoar os outros. Ser filha é a pior coisa que me aconteceu. Descobrir isso sozinha foi a segunda pior coisa que me aconteceu. Tenho um pai e uma mãe, tenho dois irmãos, uma avó paterna lá no céu e um par de avós maternos que dançam todas as noites de sábado no baile dos aposentados. Tenho um avô paterno que não vejo muito mas que me escrevia cartões e cartas no Natal. Quem me conhece sabe das dificuldades que tenho com a família, ou melhor, com as pessoas que fazem parte do álbum de família.

Não lembro da última vez que chamei meu pai de pai sem me esforçar de um jeito sufocante. E quando telefonei pro meu avô viúvo pra saber da minha tia que tem quatro anos. Não lembro quando não senti raiva da minha mãe mais que uma vez por dia. Nunca fui uma garota problemática, eu nunca dei problemas a eles e isso é não ser problemática. Sempre fiz as coisas do meu jeito, do jeito que me chatearia menos, mas que me chatearia de qualquer jeito.

Na minha caixa de E-mais Importantes

'Amigos,
na próxima segunda-feira (dia 21, 19:30hs, no auditório do MASP, grátis) tem LEITURA da minha 2a peça: "Explicando a morte para crianças de seis anos". Na abertura, leio uns dois ou três poemas acompanhado do gaitista Flávio Vajman. Do que se trata a peça? Bom, o cartaz (abaixo ou anexo, não sei como vai chegar aí pra você, pois estou enviando este e-mail direto do provedor) feito pelo grande desenhista e amigo Carcará, acho que já diz alguma coisa. Apareçam.
Abraços,
Sergio.'


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17.7.08

Joaquín Salvador Lavado

Ou simplesmente, QUINO.



“A escola era uma antecipação do serviço militar. Formar filas, manter a distância. Como a escola não era mixta, para mim, estar com homens é como voltar para a escola ou fazer o serviço militar, por isso também prefiro as amigas mulheres. Vivi o serviço militar como Felipe, pensando desde pequeno: ‘Algum dia vai ser a minha vez e vai ser horrível’. Sofri muito, mas tive que fazê-lo só por 8 meses e na cidade de Mendoza mesmo. Depois de fazer o juramento à Bandeira todas as noites, eu podia ir pra casa, mas acabava dormindo no quartel porque tinha medo de pegar no sono no dia seguinte. Eu estragava o meu domingo pensando que à noite teria que voltar ao quartel. Até hoje me acontece o mesmo. Costumo estragar o meu presente pensando no que me espera no futuro. Típico do Felipe. Não tenho mais o sonho recorrente de fazer o serviço militar, mas o tive até os 50 anos. Era sempre o mesmo sonho, que estava fazendo o serviço militar e dizia: ‘Mas eu já o fiz’. Então falava com o oficial e o cara me dizia: ‘Bom, rapaz, mas já é julho. Fica na tua porque se você for começar a querer provar que já fez o serviço militar, você vai acabar ficando aqui quem sabe até quando’. Tenho sonhos bonitos também. Há uns dois anos acordei e disse para a Alicia: ‘Sonhei uma coisa tão linda que se eu soubesse que as drogas me fariam passar pelas mesmas situações, eu me drogaria’.”
Uma Amiga me disse que tá com problemas, os problemas dela são daqueles que tiram a paz da gente, saca? Uma outra disse que tá cansada. E minha mãe voltou de viagem com mais disposição, mas ainda tá com os mesmos problemos dentro do bolso.

Estou lendo um livro do Jack London e confesso que estou fissura nesse livro. O que tem haver os problemas das pessoas citadas? Nada. Esse é o meu problema. Eu contorno todas as coisas e arrumo um jeito de escapar com um mínimo de ar reservado nos pulmões.

Hoje quando saí da minha cama meu corpo doía e minha cabeça latejava, a sinusite veio nos últimos dias e tentou me render, mas hoje eu não exclamei "oh, como dói meu corpo" eu disse "poxa, como é que fui parar naquele lugar?" o lugar era num sonho que eu acho que tive, e que não esqueci pra lembrar no fim da tarde como sempre acontece, e já não dói mais nenhum centímetro. Hoje eu resolvi andar pela sombra.

Uma Amiga escreveu que é bom estar viva. Outra não me liga mais ha quase um ano. Um amigo que cuida da saúde nem imagina o quanto guardo no peito mexicano. Ah, uma amiga me prepara a cama e um racambole com palitos de fósforo. Ele atende o telefone, diz que está indo mijar mas que pode me ouvir, e eu digo apenas que estou com saudade. E hoje eu acordei querendo só pensar em todos eles.

Um Amigo me disse que sente-se sozinho na sexta. Pergunto se ele ouve o barulhho da noite nesses momentos, e se ouve, então não percebeu que já tem o melhor de qualquer outro dia. Meu irmão está desempregado, mas continua sendo um cara bacana, entende?

Um Amigo morreu de AIDS, o Chico. Uma Amiga teve gêmeos e são dois japoneses negrinhos.

Outro, que não é meu amigo, disse que vai pra Argentina. Meu Amigo quer morrer no Rio de Janeiro.

Um Amigo me convida pra trabalhar com ele e eu digo que pensarei no assunto. Os amigos querem ajudar de algum jeito. Mas o nosso problema nunca terá solução...

16.7.08

quero uma calça de veludo azul

talvez combine com sapatos coloridos. ou botas, que cubram metade das minhas pernas. mas ninguém pode saber, porque ninguém (que é sempre alguém) entenderia. é como se fizesse poemas, daqueles redondos que ninguém entende. sei que não é culpa deles, os ignorantes, mas também não é culpa minha. me calo. mas fazer um poema que combine calças com sapatos ou dizer pra uma mulher o quanto ela envelheceu não é fácil. é pensar na dor do outro com complacência, a mesma que não poderá sentir pela sua (ou pela minha). os poetas choram tão baixinho que poucas vezes você conseguirá ouvi-los. é como se fossem mudos, os poetas. poemar redondamente lembra uma canção antiga, daquelas que o rádio teima em tocar quando seus ouvidos já não suportam mais nada. em círculo, em círculo, em círculo. não conte até três, vista sua calça de veludo azul, esqueça rimas. não conte até três em voz alta, apenas pense. e imagine meu poema sobre amores, dores, sabores e bolores.

tão bonito que seria o último, o único.

14.7.08

balões e guarda-chuva, quando andei do lado de lá


de tudo que fica guardado dentro da gente tenho certeza que a pior parte é a adolescência. quando a gente quer provar pra eles que sabemos a diferença entre solidão e ficar sozinho no quarto terminando um daqueles trabalhos de geografia. mas se disser que não sinto falta posso estar mentindo. porque eu andava na chuva sem preocupação com analgésicos e atestados médicos. comia qualquer coisa mergulhada no óleo queimado e virava a cidade ao avesso atrás de maconha, cocaína e bucetas. hoje eu preciso me apressar no transito pra não perder o emprego, naquele tempo o emprego e eu não conseguíamos nos entender. minhas roupas secavam no corpo no sofá de um amigo, ao lado da garota mais bonita do último bar. agora os sapatos esmagam meus dedos que ficaram largos e disformes com tantos anos de allstar. ela hoje diz quase não me reconhecer, ela ria da minha barba bem feita e se diverte com as minhas preocupações com a conta de água, com redução de energia, ração pros cachorros. carro e metrô, correria no corredor, o chefe e os tapinhas nas costas. pouco dinheiro e uma mulher bonita dizendo que você é o cara mais bacana do mundo. parece que tudo tá certo mas eu sinto falta daquele tempo, porque eu sabia que tudo ia passar logo e eu teria os amigos e os discos, e de algum jeito tudo ia terminar bem. mas agora pra todo lado que olho vejo paredes em preto e branco e pouca gente se divertindo. os cachorros enxergam assim, né? em preto e branco. porque eu lembro que do ônibus eu via muito mais cores nos guarda-chuva e nos balões, eu via mais balões. se eles me pergutarem a diferença de solidão, hoje, eu vou dizer a eles que estou atrasado, pra discutirmos isso outra hora. entendeu?