7.7.09

Será que quando colocar o telefone no gancho isso vai passar?
Ela sempre me pareceu bem depois de nos despedirmos, ela sempre pareceu estar melhor que eu, na verdade.
Gosto daquelas sombras nas esquinas, do calafrio, da garrafa ainda cheia, do barulho do portão de ferro batendo nas minhas costas. Mas hoje não consigo sair de casa.
Gosto da noite assim como já gostei mais dela, e de cada pedaço daquelas carnes quentes que ela balança por aí dentro daqueles vestidos infernalmente excitantes. Ela é uma vadia e eu sempre soube, e gostei disso.
Agora ela tem uma casa, um cara bacana que conserta suas torneiras e eu arrisco apostar que ela finalmente comprou a tal torradeira.
Quando ela chegou em casa com aquele recorte do jornal mostrando aquele aparelho estúpido, e muito caro, e começou a falar e falar (gritos estrangulados e assustadoramente felizes) e queria me convencer com idéias de casamento, feira no domingo e essas coisas que ninguém vê em conto de fada, eu amassei o recorte e tirei o pau pra fora, os olhos dela umedeceram no exato momento que eu coloquei a mão no rosto dela, minha amantezinha loura, mas ela nunca foi mulher de ficar sofrendo. No outro dia ela levou todas as coisas dela, deixou apenas o que eu paguei, um lençol velho e uma xícara, trincada.
Mas será que se eu telefonar agora tudo aquilo vai emergir? As brigas, as porradas, o leite quente causando ânsia em minhas ressacas, será que tudo aquilo voltaria junto depois do telefone no gancho?
Porque eu quero que ela fique lá, com toda aquela felicidade que ela comprou, com toda aquela vida que ela plantou em vasinhos pequenos. Nenhuma mulher ficou aqui dentro tanto tempo quanto a minha amantezinha loura, nem quero que alguma delas fique, é que hoje é dia quinze, é meu aniversário, e dessa vez eu não queria dormir sozinho.